domingo, 15 de agosto de 2010

O vestido



Adriana ainda não conhecia aquelas lojas... O mais perto que havia passado delas , era da rua, de dentro de algum veículo, talvez a caminho do trabalho, ou de um ônibus lotado que a espremia e que deixava sua visão turva... Nunca as havia visto com clareza.
Um dia, resolve passear por ali, a pé, nas calçadas...
Deslumbre... Emoção... Fantasiando ser alguém que pudesse estar ali, como se a festa parasse só pra ela chegar, como se a música que ouvia fosse tocada especialmente pra ela, nota por nota...
O vento ajudava , balançava seus cabelos ruivos, numa dança hipnótica como algas, e ela parou.
Na vitrine : O vestido.
Seus olhos já não eram mais opacos, a música aumentava e tudo a convidava para que se vestisse daquele sonho.
Relutou , "isso não é pra mim", mas se arrepiava ao imaginar o toque do tecido em sua pele...
Ela acreditou... Acreditou que o vestido, que ora reclamava seu corpo ora se mostrava indiferente a ela seria dela. Adriana desejava ardentemente que fosse sua única roupa, a última veste a tocar seu corpo, que nunca mais fosse vista de outra forma por ninguém e nem em seu espelho.
Fora concluído pra ela, nenhum defeito, fiel a seu corpo,sem a menor necessidade de alguma retificação.Um sonho.
Ela estava linda, feliz, pronta, se sentia amada , o vestido acariciava sua pele, a entorpecia com sussurros no ouvido, seus olhos contavam histórias, sua boca se mordia, suas mãos o tocavam e até seus cabelos ruivos pediam licença pra que pudessem se deitar sobre o tecido.
Tudo perfeito.
Ficou por ali alguns minutos... Que pareciam noites e noites de bailes, fechou os olhos e acreditou que a fotografavam, que a admiravam, mas quando os abriu ela soube que não poderia ficar com ele. O preço era alto demais...
Sentiu seu coração disparar, irracionalmente a vontade de sair correndo com ele, mesmo que tudo acabasse ali na porta da loja da pior forma, não se importava com a honra, com a vergonha , não se importava com nada, Tudo era estar dentro daquele sonho.
A luz exibiu a sua loucura e a trouxe de volta ao chão... Como se despir? como se limpar do perfume que aquele sonho possuía e que a deixava demente, alienada, vaidosa, era perigoso.
...
Nua.

Não consegue respirar, é como se sua própria nudez a sufocasse,mal pode se mexer, não consegue se olhar, seu corpo dói , é uma guerra contra seus próprios desejos, contra o pedido de sua pele, aquele vestido encantado, enfeitiçado já possui a sua alma , naquele escasso tempo. Adriana se encontrava nua e sem alma.
Enxugou-se daquela atmosfera , se encontrava cinza, sem cor, a música parou. Tudo era silêncio. Um silêncio que lhe doía os ouvidos, que dilacerava sua cabeça, aperto, dor.Dor.Dor.
O mundo a achava forte pra julgar que mesmo não sendo justo, ela superaria todo aquele limitado momento.
E Adriana vai embora... certa de que aquele mesmo vestido irá satisfazer algum outro corpo, encantará alguma outra bela mulher.... Talvez mais digna de se vestir com ele...Digna, feliz, exibida, mas sem saber que estará vestindo a alma de Adriana aprisionada naquele tecido...

2 comentários:

  1. Oi Gabi,
    Amei o conto. algumas roupas são mais do que roupas, são desejos feitos de tecido, pena que não possamos ter tudo o que queremos, sonhamos...
    a viagem foi ótima, um pouco cansativa, mas ótima.
    Bjkas e uma ótima semana para vc.

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  2. Você vai ser o primeiro blog que vou oferecer o meu Award. Só procurar no menu na parte superior do meu blog.
    Sobre o post, amei.
    Beijos.

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